Uma nova instrução normativa, publicada em 25 de março, detalha a regulamentação para controle e manejo do javali no Brasil. O animal é considerado uma das espécies exóticas invasoras mais prejudiciais ao meio ambiente e à economia. Sua caça foi autorizada em todo o país em janeiro de 2013. No Brasil já existem 44.408 registros ativos de “controladores” autorizados a capturar e abater javalis. Pelo menos 563 municípios brasileiros já foram oficialmente afetados pelo javali.
O processo de autorização para caça, que era feito no papel, passa a ser 100% digital. A normativa também dá detalhes de como devem ser as armadilhas usadas para a captura do animal e regulamenta o uso de cães. Fica permitido ainda o uso de armas brancas para o abate dos animais capturados. Na primeira legislação, de 2013, o uso de cães, armas brancas e armadilhas não era proibido, mas não havia detalhes de como esses artifícios deveriam ser empregados.
Agora, cães de caça envolvidos no controle do javali devem portar colete peitoral com identificação e seus responsáveis precisam carregar um atestado de saúde emitido por médico veterinário, além da carteira de vacinação do cão. O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) também determina as medidas de cada curral ou gaiola usados como armadilhas e reforça a proibição de artifícios capazes de matar ou ferir os javalis capturados.
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Outra novidade é que o cadastro das propriedades onde ocorrem as ações de controle passa a ficar vinculado ao número de Cadastro Ambiental Rural (CAR). A medida é considerada importante para o mapeamento das regiões de ocorrência de javalis.
Legislação detalhada
Até a publicação da nova normativa, a legislação vigente no Brasil datava de janeiro de 2013. No decreto do Ibama que autorizava o controle do javali havia previsão de que, enquanto não houvesse um sistema digital, todos os pedidos deveriam ser feitos pessoalmente.
“Enquanto não for implementado o sistema eletrônico de informação para controle de espécies exóticas invasoras as solicitações de autorizações, as declarações e os relatórios devem ser encaminhados às unidades do Ibama nos estados”, declara a instrução normativa de 2013.
Agora, para obter autorização para o manejo é preciso fazer uma inscrição online no Cadastro Técnico Federal (CTF), do Ibama, na categoria “Manejo de fauna exótica invasora”. Depois de realizado o cadastro, é necessário se registrar no Sistema de Informação de Manejo de Fauna (Simaf), que também é gerido pelo Ibama.
No Simaf ficam cadastradas todas as propriedades onde o caçador pretende fazer o manejo do javali. Após análise, o Ibama pode conceder autorização inclusive para caça em unidades de conservação como parques e florestas nacionais. As autorizações são específicas para cada propriedade e têm validade máxima de três meses.
Após as ações, os controladores precisam apresentar relatórios com o número de javalis abatidos. Os relatórios também são específicos para cada propriedade e devem ser entregues em até três meses contados a partir da data em que a autorização foi concedida.
As novas regras do Ibama são consideradas positivas por Virgínia Santiago, pesquisadora da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) que estuda a invasão de javalis no Brasil. Segundo Santiago, a digitalização vai facilitar o processo tanto para o Ibama quanto para os controladores de fauna, que tinham dificuldades para acessar as unidades do Ibama.
“Antigamente era tudo no papel e a gestão fica muito prejudicada”, explica. “Já havia a previsão de informatização dos procedimentos desde a primeira normativa mas, até agora, isso ainda não havia sido implementado.”
Para o abate é permitida a utilização de cães de caça, de armas brancas ou de armas de fogo registradas junto ao Exército na categoria Caçador, Atirador ou Colecionador (CAC). Já a captura dos animais pode ser feita também com armadilhas.
De acordo com a nova instrução normativa, fica permitido somente o uso de armadilhas do tipo jaula ou curral. Esses dois modelos são considerados mais adequados em termos de bem-estar animal, segurança e eficiência do que as armadilhas de gaiola. Também são proibidas as armadilhas de laço ou os dispositivos que envolvem o acionamento automático de armas de fogo.
Incluído em um anexo da nova norma, um guia para o produtor ruralproduzido pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) traz instruções para a construção desse tipo de artifício. No material, há a lista de materiais e os procedimentos necessários para a confecção de uma jaula de 50 metros quadrados com o custo estimado em cerca de R$ 1,4 mil.
Em nota, o Ibama disse ao G1 que as regras atendem a demandas de pequenos produtores rurais:
“A mudança relacionada ao uso das armadilhas foi incorporada por representarem um método eficaz de captura e controle, complementar a outras medidas. Além disso, atende aos agricultores de baixa renda, que não teriam recursos para arcar com os gastos relacionados às armas de fogo.”
“Era necessária uma descrição mais detalhadas das armadilhas mais adequadas”, defende Virgínia Santiago, da Embrapa. “Desse jeito você evita prejuízos aos outros animais que podem acabar sendo capturados além do javali.”
O Ibama destaca que o uso de armas brancas e cães também não são inovações. “Antes da nova instrução normativa, esses dois métodos já estavam entre os mais utilizados nas ações declaradas nos relatórios de manejo recebidos pelo Ibama”, diz o instituto.
O uso de substâncias químicas continua proibido pelo Ibama, salvo autorização de manejo extraordinária concedida pelo órgão. “As autorizações referentes a estes pedidos sempre passarão por análise específica e o uso de venenos segue vedado”, afirma o órgão.
Os javalis capturados por cães ou por armadilhas devem ser abatidos no local da captura, já que é proibido o transporte de animais vivos. O texto da norma destaca que, caso sejam empregados cães no abate do javali, é importante que ele ocorra de forma rápida, sem que provoque o sofrimento desnecessários aos animais envolvidos. Além disso, o Ibama determina que produtos e subprodutos obtidos por meio do abate de javalis vivendo em liberdade não podem ser distribuídos ou comercializados.
Caça insuficiente
Hoje existem 44.408 registros ativos no Ibama para controle do javali. Rio Grande do Sul e São Paulo são os estados onde há mais controladores de fauna exótica no Brasil. Os registros de armas de fogo do tipo Colecionadores, Atiradores e Caçadores (CAC) no Exército está crescendo: de 2016 para 2017 a quantidade de armas nessa categoria pulou de 35.042 para 57.886, um aumento de 65%. O número de javalis abatidos também está em ascensão: foi de 1.345 em 2013, quando a caça passou a ser permitida, para 8.146 em 2016, data do último levantamento do Ibama.
Apesar do aumento, a caça ainda está longe de resolver o problema dessa espécie invasora no Brasil. “A gente ainda está um pouco aquém em relação a quantidade de bichos que tem na natureza”, afirma Carlos Salvador, biólogo consultor do Plano Javali, do Ibama.
O pesquisador destaca, além do baixo número de controladores registrados, a frequência com que esses caçadores empreendem ações de manejo. “Um caçador é pouco para uma região muito contaminada e, se ele vai só de final de semana ou caça 3, 4 vezes ao ano, ele não vai dar conta da reprodução da espécie.”
A invasão de javalis no Brasil causa prejuízos para a agricultura e também ameaça a suinocultura. Como o javali e o porco doméstico são da mesma espécie, uma eventual epidemia nos javalis que vivem soltos poderia acometer os suínos de criação, representando um risco à saúde do rebanho. Além disso, o animal também ataca plantações. A cultura de milho costuma ser a mais atingida pelo suíno. Além de comer o grão quando a espiga está formada, o javali também se alimenta do adubo e das sementes, logo no início do cultivo, e derruba pés de milho por onde passa.
Apesar de necessária para reduzir o impacto da espécie, a caça do javali também tem efeitos colaterais, explica Carlos Salvador. As estratégias para controlar a espécie também podem afetar populações de animais nativos, como a queixada e o cateto, que são confundidos com javalis pelos caçadores (veja diferenças e semelhanças no infográfico abaixo).
Para evitar que animais nativos sejam prejudicados, a nova normativa do Ibama prevê que as armadilhas sejam visitadas diariamente para a libertação de animais de espécies que não são alvo de manejo. Além disso, a visitação diária garante que os javalis capturados sejam abatidos rapidamente para evitar maus tratos.
“Em caso de comprovação de caça de animais silvestres nativos, adulteração ou falsificação de documentos ou informações, as atividades serão embargadas cautelarmente”, determina o Ibama.
Fonte: SENAR (com informações do G1)