De vez em quando, eu “ressuscito” um lugar “fabuloso” nas minhas colunas… Não “fabuloso” de fenomenal… mas de “fábula”, mesmo. Por isso, hoje recorro novamente a um reino do interior do Paracá, do país Plazil, chamado “Ioioelê”, do qual já falei uma ou duas vezes…
Então…
Esse reino tinha algumas semelhanças com o “país do futuro” chamado Brasil. Mais especificamente, com o sistema de governo chamado “Municipal”.
Senão, vejamos…
Havia uns animaizinhos que se reuniam semanalmente para fazerem as leis, num lugar chamado “Cúpula”, e os bichinhos que nele atuavam eram os “Contraditores”. Algo parecido com as chamadas “Câmaras Municipais” das cidades do “país do futuro”… Era o chamado “Poder Legal”. Acima dele, havia um que comandava o reino, conhecido como “Perfeito”, que comandava as “Chefaturas”. Algo como os prefeitos que se elegem para comandar as Prefeituras. Desta vez, fora eleito o Leão Leto que estava em sua segunda gestão. Era o Poder Executor. Havia também animais ligados a outras esferas mais poderosas, a quem todos os outros poderes deveriam render-se, chamado “Palácio”. Era o Poder Controlador, exercido pelos “Motrizes” e “Fomentadores”.
As “Chefaturas” eram divididas em vários setores chamados “Alegorias” e, dentro de cada uma, os “Ciumentos”, que eram as suas subsessões. Os que comandavam cada “Alegoria” eram denominados “Sectários”.
Pois bem…
Dentre as várias “Alegorias”, havia a chamada “Alegoria das Artes”. Dependendo de quem fosse indicado para ela como “Sectário”… ela funcionava ou não (era preciso muito amor, dedicação e, sobretudo, vocação). Em determinada fase passada, fazia um bom tempo que ela era uma monotonia só…
MESMICE
É tudo sempre
A mesma coisa
Onde eu trabalho.
Onde eu trabalho
É tudo sempre
A mesma coisa,
A mesma coisa.
Eu trabalho onde
É tudo sempre
A mesma coisa
A mesma coisa
A mesma coisa
Eu trabalho sempre
Onde é tudo
A mesma coisa
A mesma coisa
A mesma coisa
A mesma coisa
Eu trabalho onde
É sempre tudo
A mesma coisa
A mesma coisa
A mesma coisa
A mesma coisa
A mesma coisa
A mesma coisa
(Adauto Mazonas)
Até que um dia…
Um dia, chegou esse bichinho que amava, dedicava-se e, sobretudo, tinha vocação para a “coisa”… Era um belo “raposo”, e seu nome era Fedro Tarques. Rodeou-se de bichos que pensavam e sentiam como ele… E aquela “mesmice”, de repente, foi se transformando numa avalanche de apresentações, shows, projetos para os bairros, para a floresta toda, tanta coisa!
Havia os projetos “Bom dia, Poesia com Café…”, “Coral Safira”, com os bichos pioneiros do reino, “Banda Tempos Modernos”, projetos “CantAgora” “Brincadeira e Arte”, os grupos de canto “Nozes” e “Quarteto Local”, o festival “IOIOFESTMUS”, em que vinham calouros de todo o Plazil, trouxeram a peça teatral “Cosmo”, com renomado ator ex-ioioelense, recriaram o espetáculo “Luar de Ontem”, criaram o show “Sertão em Vozes”, apresentações de final de ano como “Cultura Exalta Paini”, conseguiram a tão sonhada “Casa da História”… Ih! Se fosse para falar tudo, não terminaria tão cedo! Isso pra não citar as aulas que havia na sede da “Alegoria das Artes”, como de instrumentais, dança, pintura, que atendiam animais do reino com menos poder aquisitivo e a floresta em geral. Nem o apoio incondicional a um brilhante projeto arquitetado para bichinhos carentes de periferia pelo Sectário Fedro antes de sequer ser indicado para aquele cargo – que era o “Salve a Aldeia”…
Para que isso acontecesse, os bichos que ali trabalhavam tinham toda a liberdade no cumprimento dos horários, que eram diferenciados em relação às outras Alegorias, pois ali não havia feriado, sábados, domingos… Era a única Alegoria cujas subsessões não se chamavam “Ciumentos”, mas sim, “”Versáteis”, dado que cada um ali, além de cuidar de seu setor específico, era, digamos assim, “pau para toda obra”… Ali se trabalhava quando fosse necessário – manhã, tarde, noite – incluindo as madrugadas.
Não demorou a essa Alegoria que seu trabalho ficasse em destaque e fosse exaltado em todo o reino e região.
Isso, óbvio, despertou certos despeitos… a inveja de outras Alegorias e até dos Ciumentos, que eram as divisões das Alegorias, conforme explicado – e que, com certeza, querendo fazer jus ao nome, inconformados com essa situação, e vivendo nesse reino em que, ultimamente, seus habitantes estavam revelando o pior de dentro de si mesmos, na chamada Política Nacional, logo resolveram tomar uma providência…
Foram encher os ouvidos de um dos Contraditores da “Cúpula”, o nobre Abutre que, por seu porte bem menor que o dos outros, era mais conhecido como “Passarinho” e que, como nunca tinha feito nada que prestasse para aquele reino, enxergou ali uma oportunidade para tentar aparecer…
Mandou um ofício ao Sectário da “Alegoria das Artes”, pedindo-lhe que passasse por escrito o horário cumprido por cada colaborador. O “Sectário”, que não era nada paciente com esse tipo de coisa, “desancou” o tal Contraditor e disse que não iria mandar-lhe nada… Que, se ele quisesse, que fosse aos eventos nos quais, aliás, nunca fora visto – nem uma “vezinha” sequer. Aí ele teria uma “ligeira” noção dos horários que se gastavam preparando tudo aquilo.
O Contraditor Abutre, ou melhor, Passarinho, então, enraivecido, foi correndo fofocar ao “Poder Controlador”, solicitando inclusive que se pusesse na sede daquela Alegoria um Controlador de Horários (o chamado “Relógio Tonto”).
Agora o problema está lá, sendo analisado…
Há duas hipóteses para o desfecho desta historinha: ou o “Poder Controlador”, analisando o caso, opta por arquivá-lo, diante das evidências da produtividade daquela Alegoria e dos benefícios prestados à população do reino…
… ou encerra o caso determinando a colocação do tal “Relógio Tonto”, limitando a liberdade de criação daquele setor, atando-lhe irremediavelmente “patas (asas), “mãos” e criatividade”.
Então… volta a
MESMICE
(…)
Eu trabalho onde
É sempre tudo
A mesma coisa
A mesma coisa
A mesma coisa
A mesma coisa
A mesma coisa
A mesma coisa
O Contraditor Abutre “Passarinho”, “pobre de espírito” fica “felizinho” (mas nem conseguirá reeleger-se para a nova “Cúpula” a ser eleita ainda este ano, porque os “animais-cidadãos” do reino não suportam ignorância tamanha)… nas próximas gestões da “Chefatura”, os “Perfeitos” se acomodarão, não dando apoio nenhum à “Alegoria das Artes”, regredindo-a a ser novamente um “Ciumento”… (como aconteceu na maior parte do tempo…)… e os habitantes do reino Ioioelê serão condenados ao eterno e antes costumeiro marasmo cultural…
Moral da História: A Inveja causa danos internos e externos. Os externos, geralmente, são coisas materiais, que o tempo recupera, mas os internos… esses, acabam destruindo o próprio invejoso!