Toda essa polêmica protagonizada pela “reforma-Temer” do Ensino Médio me fez, de novo, voltar no tempo… Fui parar em algumas colunas minhas da época da “Tribuna de papel” – cujo título era “Minha Caneta e eu”. Especificamente a duas, datadas de … 1997!
Senão, vejamos o que eu dizia há quase vinte anos (e muito antes disso também), sobretudo aos professores de Português – mas algumas considerações bem que servem a todos:
Na coluna intitulada Pela escada afora”, eu dizia que, em uma certa aula, eu resolvera fazer junto com os alunos uma redação que eu pedira, baseada na foto de uma escadaria. “Fui subindo” a tal escada, e encontrando “alguns dos horrores do nosso ensino de língua portuguesa. Aqui, um aluninho meio abobado, tentando pensar em como realizaria aquela absurda tarefa que a professora lhe dera, sobre coletivos. “Pinacoteca”… seria palavrão? Disseram que é coletivo de quadros! E atilho? cáfila? caterva? choldra??!!
…Mais adiante, outro coitadinho se debatia para descobrir qual seria o numeral ordinal de 954. Mais um até entortava os olhos pensando em quais seriam as “locuções adjetivas” correspondentes a palustre, hibernal e columbino. E o superlativo absoluto sintético erudito de parco? de sábio? de salubre? (aliás, o que é salubre, mesmo??)
E fui por aí afora, desfilando algumas coisas que, se hoje não fazem mais parte desse ensino, acredito que seja na minoria das aulas da nossa língua. Infelizmente.
Fiz considerações como “Parei um pouco, e fechei os olhos para refletir. Puxa, há quanto tempo estudos já provaram que não se aprende o “português” assim? Quantas obras já não existem, todas comprovando que ninguém aprende a escrever por “listagens”? Que “o aluno é capaz de passar onze anos sem manter contato direto com a língua em si, pois o que lhe oferecem é apenas a meta-língua”, que ”o domínio da teoria gramatical NÃO deve ser objetivo do ensino de português”?
Assim termino aquela coluna, datada de 12/06/97:
“Resolvi continuar minha escalada, com a esperança de, chegando ao topo, vislumbrar alguma luz.
DECEPÇÃO !! O que enxerguei foram uns monstros horrorosos, desses que a gente vê nos filmes de terror, que traziam no pescoço placas com seus nomes: Preconceito, Comodismo, Tradicionalismo, Pressão, Cobrança dos Pais, Cobrança de Certos Diretores, Preguiça de Pesquisar, Beco Sem Saída, Vestibular Antiquado, Concursos Públicos…
…Comecei a entender melhor aquela expressão popular “ajoelhou, tem que rezar”… Entendi que, às vezes, fica muito difícil você remar contra a corrente…
Lá, bem no alto daquela escada, sentei-me… Arranquei uma folha de papel, escrevi uma mensagem… Coloquei-lhe o nome de “ Pela escada afora”, dobrei-a em forma de um jornal e atirei-a…”
***
Numa outra coluna, denominada “Tá” difícil!, eu contava como estava “P da cara”, como diriam meus alunos, por causa de uma prova de interpretação de textos que eu aplicara em duas turmas e os alunos de uma turma foram pior do que a outra, porque eu não percebera que, sem querer, elaborara uma mais difícil e outra mais fácil. Para me redimir daquela situação, resolvi dar uma chance, dando um pensamento para eles interpretarem em poucas linhas, valendo 2,0 para somar com a nota deles. Achei que iria “ser moleza”, mas vi que era um ledo engano! O pensamento era “A arte de viver consiste em tirar o maior bem do maior mal”. Bom, dos cerca de dez alunos que fizeram, apenas um tirou os dois pontos. Os demais… NENHUM!!
Fiquei injuriada e à noite não conseguia conciliar o sono, tentando, ainda, compreender a razão daquilo.
Na coluna, desfiei uma série de motivos, que nem sei se é o caso de repeti-los aqui… Talvez só o trecho quase final, pois tenho certeza – através de perguntas que faço aos meus alunos atuais – de que ainda acontecem:
“Pecado maior – ainda bem que é uma minoria!… – cometem certos professores que ditam aquelas indecorosas respostas em vermelho dos livros didáticos (livro “do professor”) para seus alunos, nas tais “aulas de interpretação”. Digo indecorosas, porque, primeiro, se somos professores, não temos necessidade de que venham as tais respostinhas em vermelho. Segundo, essas respostas costumam ser fechadas, isto é, não dão margem a que se levantem outras hipóteses sobre a “lição”. (talvez porque os textos sejam tão “cretinos” que não daria mesmo para explorá-los… Se já é um horror esses livros virem com respostas, imaginem o crime que é quando alguns professores resolvem ditá-las!
…Pra não falar de alguns professores que dão “esse negócio de interpretação” quando estão meio “cheios” – então mandam que os alunos abram o livro à página tal e preencham os exercícios. Depois corrigem-nos pelas “respostinhas vermelhas”, sem uma discussão, sem um debate… Pra não falar também daqueles que entra ano, sai ano e não pedem a leitura sequer de um livro no ano inteiro!… Um gibi, que fosse – já seria alguma coisa!”
Então, voltando ao problema da reforma-Temer, uma coisa, para mim, está bem clara: poderia ser a melhor reforma do mundo… a mais discutida, refletida, participativa, mais bem acabada e intencionada…
… de NADA valerá enquanto houver muitos professores lecionando como lecionam… enquanto muitos deles forem alienados cultural e politicamente… enquanto uma boa parte não dominar sequer o conhecimento de sua matéria… enquanto ficarem focando sobretudo no péssimo salário pago, na desvalorização… em todas as mazelas que, sabemos, são reais, mas não justificam vitimizar os alunos por isso… enquanto a maior parte deles não resolver pegar “o jatinho da história” (trem já está meio antiquado, né? Talvez eu devesse dizer “a nave da história”…) e tornar suas aulas vivas, atuais, engajadas… capazes de fazer, finalmente, do aluno, o tal “agente da sua própria história”…
Como disse um leitor nas páginas de cartas do leitor da última VEJA, “(…) reformas de ensino com tal envergadura não são feitas apenas com MPs, resoluções e leis. É necessário promover uma ampla reciclagem de dos professores visando a aumentar seu conhecimento, sobretudo quanto aos novos conteúdos educacionais, metodologias mais dinâmicas e participativas de ensino, a fim de envolver os estudantes na solução de problemas, além de programas de inclusão digital. (…)”
Pela “enésima vez” utilizo-me do pensamento abaixo…