A Polícia Civil do Rio detalhou nesta terça-feira, 4, a conclusão do inquérito que indiciou o vereador Jairo Souza Santos, o Dr. Jairinho, e sua namorada, a professora Monique Medeiros, pelos crimes de homicídio duplamente qualificado e tortura contra o menino Henry Borel, de 4 anos. Henry foi morto em 8 de março no apartamento do casal, na Barra da Tijuca. Ao longo de quase uma hora de entrevista, os responsáveis pelo inquérito foram taxativos em apontar tanto Jairinho quanto Monique como responsáveis pelo crime.
Segundo a polícia, os crimes a que ambos foram enquadrados preveem penas que podem chegar a 30 anos de prisão. O vereador foi indiciado por tortura, com penas que variam de dois a oito anos de reclusão – ampliada de 1/6 a 1/3 por ser contra criança – e por homicídio duplamente qualificado, com penas que variam de 12 a 30 anos de reclusão. Além do indiciamento por homicídio, Monique, por sua vez, responderá por omissão à tortura (1 a 4 anos de reclusão, além do aumento de pena previsto por ser contra criança).
O inquérito agora será encaminhado ao Ministério Público, que poderá oferecer denúncia contra o casal ou solicitar novas diligências.
“Para nós, da Polícia Civil, muito mais difícil do que prender um vereador, um político, um médico, uma liderança política da zona oeste do Rio de Janeiro influente, foi investigar, pedir a prisão e responsabilizar criminalmente uma mãe que havia perdido o seu filho de apenas quatro anos de idade”, disse o diretor do Departamento-Geral de Polícia da Capital (DGPC), Antenor Lopes. “A investigação está tecnicamente convencida, baseada em robustos elementos probatórios, da responsabilidade do vereador Dr. Jairinho e da mãe da criança, a senhora Monique, pelo omissão. A mãe da criança tinha o dever legar de cuidar do seu filho.”
No primeiro depoimento prestado à polícia, em 17 de março, Monique Medeiros disse ao delegado Henrique Damasceno, responsável pela investigação, que assistia TV em um cômodo da casa, enquanto Henry dormia em outro. Quando acordou, de madrugada, e foi até o quarto, encontrou o filho caído e machucado. À polícia ela cogitou a hipótese de a criança ter se ferido sozinha, ao cair da cama.
“Essa versão era totalmente mentirosa”, afirmou Damasceno nesta terça-feira. Segundo ele, há “provas contundentes” de que Monique sabia de pelo menos dois episódios de agressão anteriores à data da morte de Henry, e mesmo assim não tomou nenhuma atitude. “Em uma ocasião, Henry chegou a rasgar a camisa da mãe em desespero para não entrar no quarto com o padrasto”, relatou o delegado, citando conversa captada na perícia dos celulares.
Damasceno também explicou por que a Polícia Civil não quis ouvir um novo depoimento de Monique, que havia sido solicitado pela nova equipe de defesa. Segundo ele, a mãe de Henry terá mais duas oportunidades de depor à Justiça. Além disso, ao contrário do que argumenta a defesa, o delegado não viu indícios de que ela era subjugada por Jairinho e que, em função disso, teria mentido.
“Esse argumento de que a Monique era calada (na relação) é absolutamente descabido”, disse o delegado. Ele lembrou que Monique e Jairinho chegaram de mãos dadas para depor na delegacia, depuseram por horas aparentemente bem à vontade, e foram presos no momento em que dormiam juntos – num endereço diferente dos que haviam repassados à polícia. “A posição dela estava muito longe de mulher subjugada.”
Ao todo, a investigação realizou 32 oitivas, três perícias no apartamento onde ocorreu o crime e fez diversas diligências de busca e apreensão. O conjunto de provas garantiu “um respaldo técnico muito significativo” e que, segundo os responsáveis pela investigação, descartam qualquer possibilidade de acidente.
O Estadão procurou a defesa de Jairinho, que não se manifestou até a publicação desta reportagem.
A defesa de Monique afirmou, em nota, que o inquérito “foi finalizado prematuramente com erros investigativos”. A mãe de Henry foi representada inicialmente pelo advogado André França Barreto, que também defendia Jairinho e sob cujas orientações ela prestou seu depoimento à polícia, em 17 de março. Em 12 de abril Monique rompeu com Barreto e passou a ser defendida pelos advogados Thiago Minagé, Hugo Novais e Thaise Mattar Assad. Desde que assumiu o caso, esse trio pediu à Polícia Civil que tomasse novo depoimento de Monique, o que não foi feito – não há obrigação disso e o delegado responsável pela investigação decidiu não ouvi-la, ao contrário do que fez com três testemunhas. Daí a principal crítica dos advogados: “Foram reinquiridas várias pessoas e admitida mudança de seus relatos. Monique não teve igual direito, em dois pesos e duas medidas. Mesmo a reconstituição dos fatos, baseada em versão irreal de Monique sob coação e dissimulação, é imprestável”, afirma a nota do trio de advogados da mãe de Henry.
Os advogados reclamam também de não ter tido acesso à integralidade da investigação e afirmam que a polícia não levou “em conta que Monique é mais uma das muitas vítimas”. “Tratar Monique como coautora do crime é erro injustificável”, dizem os defensores. Eles concluem a nota dizendo que vão “trabalhar com objetivo de fazer prevalecer a verdade na Justiça”.