A tilápia entrou na vida do agricultor Rosimar Marquardt há 15 anos. Nos idos dos anos 2000, quando pouco se ouvia falar de criar o peixe no Paraná, ele juntou as economias, arrumou as malas e trocou o emprego de tratorista em Luís Eduardo Magalhães, no interior da Bahia, por Maripá, no Oeste paranaense.
Aceitou o convite do pai para voltar à terra natal e expandir a produção de carne branca, convencido também pela oportunidade de ter o próprio negócio. Na época, diz, nem passava pela cabeça que pouco mais de uma década depois o Paraná se transformaria no maior produtor de tilápias do País, parte do sucesso puxado justamente pela pequena Maripá. “É um sucesso, com a produção crescendo ano a ano”, conta.
Na série de reportagens que está apresentando os produtos locais dentro do projeto Feito no Paraná vamos conhecer a produção de tilápia, um dos tantos pontos fortes do Oeste paranaense.
Os números reforçam o acerto na escolha de Marquardt. De acordo com o Anuário Peixe BR de 2019, o Paraná tem liderança folgada em tilápia, com produção de 146.212 toneladas, bastante à frente de São Paulo, que está na segunda colocação, com 64.900 toneladas, e de Santa Catarina, no terceiro posto, com 38.559 toneladas. A participação paranaense no mercado nacional de produção de tilápias é de 33,8%.
Maripá, sozinha, respondeu por mais de 8 mil toneladas no ano passado, segundo o Valor Bruto da Produção Agropecuária (VBP). Fechou como o quinto maior produtor do peixe no Estado, atrás apenas de Nova Aurora, Toledo, Palotina e Assis Chateaubriand, todos municípios vizinhos de Região Oeste.
Lâminas de água como as que enchem os 12 tanques da propriedade de Marquardt são mais do que comuns na paisagem de Maripá, cidade de 5.582 habitantes de acordo com a mais recente estimativa do IBGE. “A demanda hoje é maior do que a produção. Vendo o que eu tiver de tilápia”, ressalta ele, cuja produção bate na casa das 500 toneladas por ano.
O agricultor, que reserva parte da propriedade para cultivar também milho e soja, é exceção na região. Não tem acordo com cooperativas, optando por vender o peixe para outros mercados. “Tenho minha clientela fixa, gente que compra comigo há muito tempo já”, diz.
COOPERATIVISMO – A maioria dos produtores de tilápia, contudo, mantém parcerias com fortes cooperativas paranaenses, com destaque para a Copacol, de Cafelândia, e a C. Vale, com sede em Palotina.
É o caso do engenheiro agrônomo Paulo Michelon, de Palotina. Toda a produção, de 1,2 milhão de tilápias espalhadas em 185 mil metros de lâmina de água de 10 tanques é encaminhada para a C. Vale. De lá, vira filé congelado e ganha o Brasil e o mundo, numa equação de ganha-ganha.
Entusiasmado com a criação, ele projeta ampliar em mais 150 mil metros as lâminas de água com a aquisição de uma nova propriedade na região. É o caminho para praticamente dobrar a produção com mais um milhão de tilápias espalhadas nos novos tanques.
“A tendência é aumentar, há mercado para isso. Basta melhorar a renda que o brasileiro vai começar a comer melhor, acrescentando o peixe à refeição. Sem contar a exportação, que ainda está engatinhando”, afirma. “Essa nova geração também está mais preocupada com a saúde, e aí a carne branca se torna essencial”, acrescenta.
A criação do peixe transformou a aposentadoria de Adair Borin, também conveniado da C. Vale em Palotina. Há cerca de dois anos ele deixou de arrendar a propriedade para plantadores de soja com a intenção de se dedicar à piscicultura. Hoje tem 350 mil tilápias em 58 mil metros de lâminas de água, divididas em oito tanques. “Estou gostando muito da atividade. Se tudo ocorrer bem, penso em aumentar em mais 40 mil metros”, afirma.
SUCESSO – O poderio do Paraná em relação às tilápias passa necessariamente pelas cooperativas. A Copacol, por exemplo, abate 160 mil tilápias por dia nos frigoríficos de Nova Aurora e Toledo, vindas de 230 produtores integrados. Número que, pelo planejamento, vai saltar para 250 mil peixes/dia, chegando a 400 associados em 2023.
“O mercado interno vai crescer. O mercado externo da tilápia também. Atualmente, a Copacol movimenta R$ 70 milhões por ano entre os produtores associados”, ressalta o presidente da cooperativa, Valter Pitol.
Perto dali, a C. Vale de Palotina abate outras 100 mil tilápias por dia, com planejamento de curto prazo para chegar a 150 mil. “Com isso, ajudamos pequenos agricultores a permanecerem no campo e se transformarem em micro e médios empresários. O impacto na qualidade de vida dessas pessoas é imenso”, explica o presidente da cooperativa, Alfredo Lang.
EXPORTAÇÃO – No ano passado, de acordo com os dados do Ministério da Economia usados como base do levantamento da Peixe BR, as exportações da piscicultura de cultivo (filés e subprodutos alimentícios ou não – peles, escamas, farinhas e outros) renderam US$ 12 milhões. Os pescados em geral geraram US$ 275 milhões.
O volume de produtos de pesca de cultivo exportado ainda é pequeno, mas crescem a cada ano. De 2018, quando foram enviados para fora do País 5.185 toneladas, para 2019 o acréscimo foi de 26% e passou a 6.543 toneladas. A tilápia está no topo, com 81% de participação. O Paraná foi o segundo Estado exportador de tilápia e derivados, com pouco mais de 1.302 toneladas (24,47% do total). A primeira colocação é de Mato Grosso do Sul, com 2.085 toneladas (39,19% de participação).
Japão, China e Estados Unidos são os principais compradores da piscicultura de cultivo brasileira. Japão e China importam mais subprodutos.
NOVIDADE – Tanto C. Vale quanto Copacol passaram a adotar neste ano uma nova especialidade de exportação de tilápia. Semanalmente, cada cooperativa exporta para os Estados Unidos, via transporte aéreo, cerca de 800 quilos de filé resfriado, produto com alto valor agregado. O voo sai na terça à noite de São Paulo e chega em Miami na quarta pela manhã.
“É o peixe do Paraná alimentando o povo brasileiro e também o do Exterior”, destaca Pitol.
EMPREGO – Toda essa movimentação rende, somando as cooperativas, 27 mil postos de trabalho da Região Oeste do Paraná. Parte diretamente relacionada à cadeia do peixe. O coordenador de manutenção Lucinei Almarone Ramiro, por exemplo, trocou o emprego numa usina de açúcar e álcool em Naviraí, no Mato Grosso do Sul, por um cargo na C. Vale de Palotina há pouco mais de três anos.
Começou a cuidar das máquinas antes mesmo de o frigorífico de peixes ser inaugurado. Estudou, casou, mudou de cargo e montou uma espécie de República do Mato Grosso do Sul na cidade, sendo o responsável direto pela contratação de quatro amigos do antigo estado. “A região é boa demais, só não trabalha quem não quer”, diz. “E eu que nunca havia ouvido falar de frigorífico de peixe, agora posso dizer que o peixe transformou a minha vida”, afirma ele, que autoproclama um pescador das águas doces do Pantanal.
Outro caso é o de Franciele Nogueira Borges. Ela entrou como auxiliar no frigorífico da Copacol em Nova Aurora, virou coordenadora e agora conta os dias para chegar janeiro e pegar o diploma de Processos Gerais. Será mais uma graduada na cooperativa, com foco em seguir crescendo na carreira. “Tenho muito orgulho de tudo. E de poder dizer que Nova Aurora é a capital nacional da tilápia”, diz, sorrindo.